domingo, 27 de abril de 2008

JOÃO DO RIO: O CRONISTA QUE TRAZ A CIDADE NO PRÓPRIO NOME


"Cronista, repórter, colunista social, João do Rio é uma das maiores expressões da cultura brasileira (...). Mulato e homossexual, ele tudo viu e ouviu: candomblés, cartomantes, atrizes, políticos, literatos, socialites e marginais. Rui Barbosa, Marcel Proust, Isadora Duncan, o marinheiro João Cândido, José do Patrocínio, Tia Ciata são alguns dos muitos personagens que desfilam nas páginas de seus livros. Quando morreu, aos 39 anos, sua imagem se confundia com a do Rio de Janeiro, que ele soube representar tão bem em tudo que escreveu".
RODRIGUES, João Carlos. João do Rio: uma biografia. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996.







"Paulo Barreto [nome verdadeiro de João do Rio], jornalista e acadêmico, critica o estabelecido num outro ponto: o corpo, a moral (...). Em seu próprio corpo inscreve o paradoxo: João do Rio postula, de um lado, a atenção à moda mas, de outro, desacata qualquer regime alimentar. (...) A atenção que João do Rio presta a certos discursos como o do traje, incluindo nele o dos perfumes ou o discurso amoroso, são manifestações de discursos alternativos contra a voz autorizada".
ANTELO, Raúl. João do Rio - O dândi e a especulação. Rio de Janeiro: Taurus, 1989.


"Essa eclética reunião de estilos, linguagens e filosofias - que, em outros autores revelaria somente um ecletismo superficial - é a própria essência de João do Rio e de sua época, cheia de antigas novidades e imortais velharias. Para um tempo de transição, um estilo e uma linguagem de transição"
RODRIGUES, João Carlos. "Prefácio". In: Dentro da noite. São Paulo: Antiqua, 2000.

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ATIVIDADE PARA A PRÓXIMA AULA (29 DE ABRIL)

LEITURA E ANÁLISE DOS SEGUINTES TEXTOS:

1. OS LIVRES ACAMPAMENTOS DA MISÉRIA (Texto integral disponível em http://pt.wikisource.org/wiki/Os_Livres_Acampamentos_da_Memória )

2. OS FEITICEIROS (Texto integral disponível em http://pt.wikisource.org/wiki/Os_Feiticeiros )

3. A AVENTURA DE ROZENDA MOURA (Texto integral disponível em http://pt.wikisource.org/wiki/A_Aventura_de_Rozendo_Moura )



quinta-feira, 24 de abril de 2008

MACHADO DE ASSIS CRONISTA



ATIVIDADE PARA A AULA DO DIA 13 DE MAIO


ANÁLISE DE DUAS CRÔNICAS DE MACHADO DE ASSIS:


A primeira, que está disponível na xerox, é datada de 31 de maio e começa pela frase: "A fuga dos doidos do Hospício é mais grave do que pode parecer à primeira vista". Esta crônica pode ser encontrada na antologia Crônicas escolhidas, publicada pela Ática em 1994.


A segunda, datada de 1896, não está disponível na xerox, sendo reproduzida abaixo. Nosso objetivo é estabelecer uma relação entre as duas crônicas e, posteriormente, compará-las com o tratamento dado pelo autor ao tema no conto e no romance.



Crônica publicada em A SEMANA
[22 de novembro de 1896]



A NATUREZA tem segredos grandes e inopináveis. Não me refiro especialmente ao de anteontem, no Cassino Fluminense, onde algumas senhoras e homens de sociedade nos deram ópera, comédia e pantomima, com tal propriedade, graça e talento, que encantaram o salão repleto. Não é a primeira vez que a comissão do Coração de Jesus ajunta ali a flor da cidade. Aos esforços das senhoras que a compõem correspondem os convidados, — e desta vez apesar do tempo, que era execrável, — e aos convidados, em cujo número se contava agora o Sr. vice-presidente da República, corresponderam os que se incumbiram de dizer, cantar ou gesticular alguma cousa. Outros contarão por menor e por nomes o que fizeram os improvisados artistas. A mim nem me cabe esta nota de passagem, em verdade menos viva que a do meu espírito; mas, pois que saiu, aí fica.

Não: o inopinável e grande da natureza a que quero me referir, é outro. Um dos maiores sabe-se que é o suicídio. que nos parece absurdo, quando a vida é a necessidade comum; mas, considerando que é a mesma vida que leva o homem a eliminá-la, — propter vitam, — tudo afinal se explica na pessoa que pega em si, e dá um talho, bebe uma droga ou se deita de alto a baixo na rua ou no mar. As crianças pareciam isentas dessa vertigem; mas há ainda poucas semanas deram os jornais notícia de uma criaturinha de doze anos que acabou com a existência, — uns dizem que por pancadas recebidas, outros que por nada.

Tivemos agora um caso mais particular: um fazendeiro rio-grandense deu um tiro na cabeça e desapareceu do número dos vivos. O telegrama nota que era homem de idade, — o que exclui qualquer paixão amorosa, conquanto as cãs não sejam inimigas das moças; podem ser invejosas, mas inveja não é inimizade. E há vários modos de amar as moças, — o modo conjuntivo e o modo extático; ora, o segundo é de todas as fases deste mundo. Além de idoso, o suicida era rico, isto é, aquele bem que a sabedoria filosófica reputa o segundo da terra , ele o possuía em grau bastante para não padecer nos últimos dias da vida, ou antes para vivê-los à farta, entre os confortos do corpo e da boca. Não tinha moléstia alguma; nenhuma paixão política o atormentava. Qual a causa então do suicídio?

A causa foi a convicção que esse homem tinha de ser pobre. O telegrama chama-lhe mania, eu digo convicção. Qualquer, porém, que seja o nome, a verdade é que o fazendeiro rio-grandense, largamente proprietário, acreditava ser pobre, e daí o terror natural que traz a pobreza a uma pessoa que trabalhou por ser rica, viu chegar o dinheiro, crescer, multiplicar-se, e por fim começou a vê-lo desaparecer aos poucos, a mais e mais depressa, e totalmente. Note-se bem que não foi a ambição de possuir mais dinheiro que o levou à morte, — razão de si misteriosa, mas menos que a outra; foi a convicção de não ter nada.

Não abaneis a cabeça. A vossa incredulidade vem de que a fazenda do homem, os seus cavalos, as suas bolivianas, as suas letras e apólices valiam realmente o que querem que valham; mas não fostes vós que vos mataste, foi ele e nada disso era vosso, mas do suicida. As causas têm o valor do aspecto, e o aspecto depende da retina. Ora, a retina daquele homem achou que os bens tão invejados de outros eram cousa nenhuma, e prevendo o pão alheio, a cama da rua, o travesseiro de pedra ou de lado, preferiu ir buscar a outros climas melhor vida ou nenhuma, segundo a fé que tivesse.

O avesso deste caso é bem conhecido naquele cidadão de Atenas que não tinha nem possuía uma dracma, um pobre-diabo convencido de que todos os navios que entravam no Pireu eram dele; não precisou mais para ser feliz. Ia ao porto, mirava os navios e não podia conter o júbilo que traz uma riqueza tão extraordinária. Todos os navios! Todos os navios eram seus! Não se lhe escureciam os olhos e todavia mal podia suportar a vista de tantas propriedades. Nenhum navio estranho; nenhum que se pudesse dizer de algum rico negociante ateniense. Esse opulento de barcos e ilusões comia de empréstimo ou de favor; mas não tinha tempo para distinguir entre o que lhe dava uma esmola e o seu criado. Daí veio que chegou ao fim da vida e morreu naturalmente e orgulhosamente.

Os dous casos, por avessos que pareçam um ao outro, são o mesmo e único. A ilusão matou um, a ilusão conservou o outro; no fundo, há só a convicção que ordena os atos. Assim é que um pobretão, crendo ser rico, não padece miséria alguma, e um opulento, crendo ser pobre, dá cabo da vida para fugir à mendicidade. Tudo é reflexo da consciência.

Não mofeis de mim, se achais aí um ar de sermão ou filosofia. O meu fim não é só contar os atos ou comentá-los; onde houver uma lição útil é meu gosto e dever tirá-la e divulgá-la como um presente aos leitores: é o que faço aqui. A lição que eu tirar pode ter a existência do cavalo do pampa ou a do navio do Pireu: toda a questão é que valha por uma realidade, aos olhos do fazendeiro do sul e do cidadão de Atenas.

A lição é que não peçais nunca dinheiro grosso aos deuses, senão com a cláusula expressa de saber que é dinheiro grosso. Sem ela, os bens são menos que as flores de um dia. Tudo vale pela consciência. Nós não temos outra prova do mundo que nos cerca senão a que resulta do reflexo dele em nós: é a filosofia verdadeira. Todo Rothschild and Sons, nossos credores, valeriam menos que os nossos criados, se não possuíssem a certeza luminosa de que são muito ricos. Wanderbilt seria nada; Jay Gould um triste cocheiro de tílburi sem possuir sequer o carro nem o cavalo, a não ser a convicção dos seus bens.

Passai das riquezas materiais às intelectuais: é a mesma cousa. Se o mestre-escola da tua rua imaginar que não sabe vernáculo nem latim, em vão lhe provarás que ele escreve como Vieira ou Cícero, ele perderá as noites e os sonos em cima dos livros, comerá as unhas em vez de pão, encanecerá ou encalvecerá, e morrerá sem crer que mal distingue o verbo do advérbio. Ao contrário, se o teu copeiro acreditar que escreveu os Lusíadas, lerá com orgulho (se souber ler) as estâncias do poeta; repeti-las-á de cor, interrogará a teu rosto, os teus gestos, as tuas meias palavras, ficará por horas diante dos mostradores mirando os exemplares do poema exposto. Só meterá em processo os editores se não supuser que ele é o próprio Camões: tendo essa persuasão, não fará mais que ler aquele nome tão bem visto de todos, abençoá-lo em si mesmo; ouvi-lo aos outros, acordado e dormindo.

Que diferença achais entre o mestre-escola e seu copeiro? Consciência pura. Os frívolos, os crentes de que a verdade é o que todos aceitam, dirão que é mania de ambos, como o telegrama mandou dizer do fazendeiro do Sul como os antigos diriam do cidadão de Atenas. A verdade, porém, é o que deveis saber, uma impressão interior. O povo, que diz as cousas por modo simples e expressivo, inventou aquele adágio: Quem o feio ama, bonito lhe parece. Logo, qual é a verdade estética? É a que ele vê, não a que lhe demonstrais. A conclusão é que o que parece desmentir a natureza da parte de um homem que se elimina por supor que empobreceu, não é mais que a sua própria confirmação. Já não possuía nada o suicida. A contabilidade interior usa regras às vezes diversas da exterior, diversas e contrárias. 20 com 20 podem somar 40, mas também podem somar 5 ou 3, e até 1, por mais absurdo que este total pareça; a alma é que é tudo, amigo meu, e não é Bezout que faz a verdade das verdades. Assim, e pela última vez, repito que vos não limiteis a pedir bens simples, mas também a consciência deles. Se eles não puderem vir, venha ao menos a consciência. Antes um navio no Pireu que cem cavalos no pampa.


ASSIS, Machado de. Obra Completa, vol. III, Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p. 741-744.

CRÔNICA - SÉCULO XIX

Rio de Janeiro - Rua do Ouvidor, século XIX.
I. CRÔNICAS:

ALENCAR, José de. Ao correr da pena. São Paulo: Melhoramentos, s/d. Reúne a produção de Alencar nos jornais "Correio Mercantil" e "Diário do Rio", entre 1854 e 1855. Comentários políticos se misturam com descrições da vida social urbana (carnaval, mundanismo incipiente etc).
ALMEIDA, Manuel Antônio de. Obra dispersa. Rio de Janeiro: Graphia, 1991. Este volume reúne a pequena produção do autor como cronista, anexando-lhe, por outro lado, diversas crônicas sobre M. A. de Almeida assinadas por Francisco Octaviano, Machado de Assis, Lima Barreto etc.
FRANÇA JÚNIOR. Política e costumes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1957. Reúne folhetins publicados ntre 1867 e 1868 em que o autor acompanha a evolução da vida social do país, fixando-lhe, nos traços rápidos de sua pena satírica, os costumes e as movimentações políticas.
MACEDO, Joaquim Manuel de. Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro e Memórias da rua do Ouvidor. Rio de Janeiro: Ediouro, s/d. Folhetins reunidos em livro, datados respectivamente de 1862-1863 e 1878. Flâneries pelos pontos pitorescos do Rio Imperial.
POMPÉIA, Raul. Crônicas do Rio. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, 1996. Organizada por Afrânio Coutinho, a obra reunida de Raul Pompéia não deixou de ostentar sua produção como cronista. Nesta edição da "Biblioteca Carioca", temos uma seleção de crônicas publicadas em jornais mineiros pelo autor de O Ateneu entre 1888 e 1889. Destaque para a pungente crônica em que noticia a proclamação da República ocorrida no dia anterior.

Rio de Janeiro - Pequena África.


Rua do Ouvidor.

II. TEORIA E CRÍTICA:

A Cronica - o gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Campinas: Unicamp: Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1992.

Ensaios de Antonio Candido, Luiz Costa Lima, Marlyse Meyer, Raúl Antelo, Telê Ancona Porto Lopez, Flora Süssekind, José Murilo de Carvalho, Francisco Foot Hardman etc sobre a história e o desenvolvimento da crônica na literatura brasileira, desde o século XIX até meados do século XX. São estudados, entre outros, autores como Alencar, Machado, João do Rio, Lima Barreto e Mário de Andrade, aqui analisados em virtude de suas atuações como cronistas.


Cena de rua. Rio de Janeiro, século XIX.

EMENTA LITERATURA BRASILEIRA III (GLC 00205)



LITERATURA BRASILEIRA III (Código: GLC00205)



Objetivos da Disciplina:

Levar o aluno a estudar as obras representativas da prosa de ficção brasileira dos séculos XIX e XX, tomando-se como marco inicial as obras de Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar e marco final as de Guimarães Rosa e Clarice Lispector.


Descrição da Ementa:

Estudo de narrativas brasileiras (crônica, conto e romance) produzidas nos séculos XIX e XX, levando-se em conta os eventos literários, culturais, sociais e históricos fundamentais. Problematização dos vários estilos e procedimentos narrativos que se sucedem e se articulam por semelhanças ou diferenças no diálogo com o passado estético-cultural brasileiro e europeu. Comentário, em face do largo espectro de obras e de autores que podem comportar esta ementa, da prosa de José de Alencar, Machado de Assis, Aluísio Azevedo, Euclides da Cunha, Lima Barreto, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Clarice Lispector.